CXXXIX

Uma Morte Anunciada

Aos olhos peregrinos
sou um mundano moribundo,
atravessando buracos profundos,
pouco se lixando
com as repercussões do futuro
 
Que nem uma bela poesia,
encarcerada, dentro de uma caixa,
sem vida, perdida,
sem chance de ser encontrada,
vivo na mais abismal escuridão,
de segunda a domingo
em aguda depressão,
perguntando-me o que seria <<se>>
se os planos não tivessem falido...

Às vezes desejo morrer,
mas são tantos problemas
que ela acaba se tornando
a última na lista de afazeres

Então, perece uma nova esperança,
nasce mais um sentimento de vingança
Este, porém, é engolido pela garganta,
ficando inerte, para sempre, nas entranhas

Nunca perdi ninguém na vida
Não obstante a morte e o futuro
serem os meus maiores medos
A morte dos pais, dos irmãos,
dos amigos e dos filhos
O medo da carreira fracassada,
de amar e não ser amado
O medo do divórcio,
e outras coisas do quotidiano...

Rumo numa jornada solitária,
enfrentando fantasmas na hora do dia
Sinto que minha presença
causa repúdio à luz ensolarada...
Pudera! Sou um homem sem crença,
cético de tudo que me entra na cabeça

Os comprimidos,
que antes ajudavam-me a dormir
e suavizar o meu fim,
hoje já não fazem efeito algum
Então, a prescrição do doutor passou a ser:
<<sorrir>>

O sorriso, lentamente,
transformou-se em risadas
para esconder o choro seco e as mágoas
Infelizmente nessas risadas, sou uma corrente rasa...
Que adianta?! Se tudo que julgo passar, não passa!!

CLXXII

Estado da Nação

Passos desaceleraram 
ao ver as machetes do "O País"
Surpresa!
Novo empréstimo do FMI
 
JLO humilha-se à China
para tapar os buracos do país 
Enquanto isso abafa o caso 
alegando que vai cortar o mal pela raiz
 
Manos e manas a se espalharem 
Efeito do iPhone XI
Fake News são vendidos rapidamente 
Wey Tommy e a Poca Py
 
Mosquitos fazem manifestação
nas vias principais das águas paradas
As mortes causadas pela jarda
superam, pela primeira vez, a malária
 
Depois de Eva Rap Diva 
Gilmario é expulso do paraíso 
A crise finalmente chegou no partido 
Mamas zungueiras já não temem a polícia
Agora batem de frente com IVAn
subindo o preço da mandioca, ginguba, 
até do tão amado pão com isca
 
Jejum de maratonas
leva jovens a questionar
as incompetências do MPLA
Será que é desta que os marimbondos
serão expulsos do lar?!
População angolana fodida com JLO
e o seu lema de governação
"Exonerar e Viajar"
 
Nomeação de Adalberto Júnior
mostra que UNITA
não é apenas bom de contas
mas também em democracia
Totalmente oposto
daquilo que a oposisão dizia...
 
O feminismo continua a colher os seus frutos
Mulheres assumem postos antes privilegiados,
dão capote no machismo angolano,
e, claro, também empatam homens no álcool
 
Crianças, o bode expiatório dos problemas
Se não são acusadas de feitiçaria
são infectadas com sida
Jornal de Angola ou Maka Angola? 
Na Lente! Grande notícia!
 
No Sambila,
adolescentes fazem richa com catanas na street
Onda de crimes assola a capital do país
Este é o mundo do Grand Theft Auto: Kianda City
E, meus irmãos, não somos nós na posse do joystick
 
Locais de festas a se tornarem igrejas 
Igrejas a se tornarem bordéis 
Entretenimento e empreendimento,
em que somos meros consumidores fiéis
 
Gatuno não é apenas aquele com arma,
também é aquele que veste o terno
Todo mundo contra todo mundo 
a ver se conseguem 
passar pela porta do governo 
Soldados da fortuna a lutarem pelo sustento 
Dar o cú para ter o cú no parlamento,
é o glorioso desejo eterno
 
Situação angolana é um filme de terror
Governo desperta dos mortos
abre luta contra os marimbondos
A população, como insatisfeito telespectador
é quem vive o satírico horror
E, nesse filme, adivinha quem é o director?! 
Nada mais do que o exterminador JLO!!
 
A gatunice precisa imediatamente
de uma ressignificação
Membros do governo
em negócios obscenos
para ver se palavra "marimbondo"
irá ganhar a "Palavra do Ano"
De tanta concorrência,
os kotas terão de optar pelo peculato
 
A esperança é a última a morrer
Isto até o IVA aparecer
Equidade é jogo de "Mete Tira"
em que a Dona Ana Joaquina brinca
no seu Palácio da Justiça
JLO pediu-nos resilência
sem na verdade nos ensinar como
Bem que nós tentamos,
até vermos aquele bolo...
 
Pretas e pretos estão se amando,
lavando o cabelo da cor do pecado
Muitos não sabem,
mas foi o profeta quem o disse no passado
que a negritude é salvaguarda
dos valores culturais
E nota-se, pois, vestimos agora
os panos dos ancestrais
Abertamente falamos das origens dos nossos pais
os seus dialectos, costumes e gastronomias
 
Roubar é permitido 
Falar dos que roubam 
É proibido!
 
Mambimbi foi um profeta
Manguxi foi um oráculo
Holden pegou nas bicuatas e deu o voado*
Zé Dú foi um astuto kalupeteka
JLO é o prometido pastor das ovelhas
Já se pode notar o padrão
E nós a pensar que somos um Estado Laico
Só que não!
Somos governados pela mesma religião
"O Reino do Maribondismo"
alocando ceguidores* para o seu plano de acção
[...]
Se Angola fosse Nárnia,
a profecia finalmente
se cumpriria, a dinastia continuaria
e as palavras do velho oráculo
finalmente sentido fariam:
 
"Havemos de Voltar"
CLXVIII

Devoradora de Livros

Ela é cidadã do mundo,
o seu passaporte são livros...
Vermelhos, azuis,
verdes, pretos,
brancos ou amarelados.
Alguns destes são novos,
velhos, de bolso ou grandes.
Certeza há, que todos
são diplomáticos.


Apesar de gostar de café, o chá verde sem açúcar com um pitada de mel e limão, é a combinação ideal para uma manhã de leitura.
Ela faz de conta que é uma rosa à mercê dos ventos. Ora navegando entre o céu e o mar, ora atravessando dunas e montanhas. De tanta imaginação, ou ela adormece com o livro no outro lado da cama, ou não se apercebe da chávena quente que repousa sobre as folhas do livro, fazendo com que elas vão ganhando áurea em forma de manchas.


Não há necessidade de impor metas. Ela não deve ser forçada, idem. Quando a leitura é prazerosa, ela é naturalmente incentivadora. - dizia ela.

Ela possui livros para tudo e inclusive para qualquer ocasião. Livros de cozinha, de empoderamento, elevação profissional, livros para se ler num sábado de praia, no banheiro, livros de bolso para se ler no candongueiro... até a Bíblia ela lia. 

Certa vez ao andarmos pela rua, avistou vários livros estendidos no chão a serem vendidos por um senhor com um pouco mais de meia idade. Virou bruscamente de direcção e quando lá chegou, pôs-se a contemplar pelos títulos para ver se reconhecia pelo menos um.
- Aha! - exclamou ela depois de algum tempo perdida e indecisa a olhar para tantos livros.
- Passa-me aquele, senhor. - disse ansiosa.
Ao segurar o livro, notei que era bastante amarelado, a capa estava murcha e a ceder aos bocados...
- Quero este! - gritou apreensiva, sequer ter acabado de ler o prefácio.
O senhor olhou para ela admirado pela sua energia. Então os dois puseram-se a olhar para mim. O senhor a querer receber o dinheiro e ela a querer levar o livro para a casa.
- Quanto custa? - perguntei eu extremamente hesitante.
- 3000kz.
- Não tenho o suficiente!
- Quanto tens?
- (olhei para a carteira) 2000kz... e com as moedas tenho (meti os dedos no bolso de moeda da jeans)... 2300kz.
- Eu tenho 1000kz.
- Não é suposto ser para o táxi?
- Não faz mal. 

Tendo já efectuado a compra, continuamos a descer pela Avenida Brasil. Uma vez mais, ela parou de repente. Abriu-o, deu um soprou e umas tapas. Revirou algumas páginas e de seguida encostou o livro no seu rosto e inspirou tão profundo como se fosse analgésico. De seguida, expirou lentamente apaixonada, como se contente estivesse pelo orgasmo causado.
 
E foi assim que aprendi algo interessado sobre ela. Que quanto mais poeirentos e velhos fossem os livros, mais saborosos e nostálgicos seriam os seus conteúdos
 
CCXII

Luanda, sua prostituta!

Coitada de Luanda,
onde o poder compra as suas curvas
com empreitadas
Estrangeiros seduzidos pelas suas noitadas

Coitada de Luanda,
sem escolhas, ela troca tudo por kwanzas
Dando prioridade a quem mais paga
Oh, Luanda!
Mas que mulher precoce te tornaste!

Antes,
uma linda beldade,
com um corpo esbelta
e seios pequenos
Hoje,
na falta de investimento 
e a barriga cheia de pneus,
já não és o predilecto pitéu
Resultado do leite ter azedado
e o esperma ter adocicado
Não passas de uma mulher
fora do padrão americano
à busca do sustento europeu

O tempo passou
Novinhas nasceram
Então, maquias a tua beleza
com betumes e pedras
para agradar o branco
que sempre preferiu as magrelas
Tal como as estradas desabam,
assim cai o teu betume com chuvas de lágrimas

Injectas a economia em tuas jardas
Declaras-te uma mulher independente
roubando terras dos outros
E para quê?!
Para ver os teus filhos únicos a sofrer,
dentro de um acaba-de-me-matar*,
a morrerem por falta de iluminação
nos labirintos do Zenga

E tu, sem vergonha na cara,
ousas, ainda assim,
exibir as tuas cirurgias plásticas
minimamente completadas,
injectando a economia em tuas jardas,
que de tanta má gerência elas apodrecem
tal como o lixo e as águas paradas

O ocidente fode e chula os barões
Os barões, de tanto stress, fodem-te a ti
E tu, sem saber o que fazer,
chulas os empregados dos barões
E assim segue o jogo da foda
Cada um pega e passa
Tal como diz a anciente história...

O poder te seduziu
A luxúria te vestiu
O tempo ditou os problemas
O dinheiro reduziu
O lixo te extinguiu
Entretanto,
ainda tens a fama
de ser a mulher mais cara
para se levar na cama
E como pode?! Se há rumores
dizendo que estás acabada

Já não dá para renovar as jardas
ou ter maquiagem betuminosas
e louboutin de varões altos
E agora, agora que a banga acabou
e a tua cara inflamou,
tens a difamação de uma prostituta
que serve a todos e agrada poucos

Quando deres por ti,
estarás outra vez grávida
E como quem da piada ri,
estaremos novamente
a bater a porta do FMI.

CXXXVIII

Tudo Vale!

Tudo vale!
Nesse jogo não há batotas
Tua vitória é minha vitória
Destarte, não haver derrotas

Tudo vale!
No tapete ou na cama
Na cozinha ou na sala
No quarto das crianças
ou mesmo na varanda

Aonde quer que seja,
o importante mesmo é fazer
Mas que se faça bem!
O que é mal feito causa arrependimentos
Então façamos, meu bem

Tudo vale!
Pegar na peruca ou rasgar a camisa
Com ou sem camisinha
Rápido e forte
Ou gostoso e lento

Tudo vale!
Desarrumar a casa ou quebrar a mobília
Deixar que os vizinhos chamem a policia
Em tempos de tréguas ou intrigas
Temos de saber que haverá sempre carícias

Aonde quer que seja,
o importante mesmo é fazer
Mas que se faça bem!
O que é mal feito, causa arrependimentos
Então façamos, meu bem

Até porque,
nesse jogo vale tudo
Só não vale mesmo
é acordar as crianças.

CLV

A Peace With The Past

Something abrupt happened almost 2 years ago. In my many attempts to amend the situation, which I miserably have failed, I always felt guilty and a constant burden in my head. After all, it all happened because of me...well sort of.

In the last month, May 2019 to be more precise, something outta usual happened. I was in a taxi, and right after I got out I heard a loud voice calling for my name. Time has passed and that voice was no longer familiar to my ears. So, without many expectations, I turned around and besides noticing only this person, there were also blurred faces of the crowd around us. And there she was. A little bit thinner, little to no makeup, a black eye line, a black dress, a long black African blazer, and a sleek bun. She looked like a doll albeit being one year older than me.

It was shock and surprise at the same time. I walked towards her, gave a hug and instantaneously felicitated for her engagement (did I say she was engaged?!). Happily, she thanked for my vow of felicitation. In full ecstasy, she then grabbed my hand and said:

- Where is the ring? Aren't you married?
- Nope. I am not. Too early to be, don't you think? Argh! Sorry. You just got engaged.
- Yeah! - She replied, raising her hands making a gesture with the fingers to show me the ring.
- What about your girlfriend?
- Don't have either.
- Why not?
- Perhaps I am not looking enough...
- Don't worry. God will provide. (did I tell she was dedicated to a religious life?!)

So yeah, we kept talking as we were walking. Her engagement, my life, her fiance, my activities, her church, my studies...
Anyway, it happened against all the odds in the world, especially in one of the most unusual ways...The universe has a strange way to reveal itself - I thought.
I felt relieved when we, perhaps for the last time, extend our arms, and with an open heart along with a smile in our faces, we gave a long goodbye.
If we didn't find happiness in each other arms, then I am more than happy that there is an arm were she will find comfort and love.
After all, she was happy, which was exactly what I would have wished.

P.S: Not everyone has the oportunity to make peace with the past. This situation has taught me that it ain't good to end a relationship with bad blood, because, let's be honest, you never know that the future holds. If you find yourself in the same feet, I urge you to atleast try and not be the person who thinks as below:

If we ever be friends again then we never loved enough.

CXXXIX

Quem Somos Nós

Geração Y - Millennials
Somos heroís desconhecidos,
sem capa, sem farda, e sem arma
Desempregados e sem precedentes,
vivendo do sabor de uma vida mal amada..

Vivíamos sob o teto do governo português
onde sentimos na pele a repressão e a opressão
35 anos mais tarde,
o governo é outro mas a escravatura é a mesma,
pois a luta agora é contra o peculato e a corrupção.

Geração Z
Somos jovens suicidas,
asfixiados pela demanda de expectativa
a dizer aos outros jovens que o suicídio não é a solução.

Somos fumantes,
Mas optamos pela palavra "amante"
O pulmão e o coração, inocentes,
algemados numa nebula de fumo,
expelindo pela boca o odor do defunto
que aos poucos vai cavando o seu próprio túmulo.

Outrora ancestrais com catanas, hoje
filhos com lápis e esferográfica
a caminho de três formações mal formadas
Luandando no final da tarde,
depois de sair da Baixa para o CV entregar,
bombom com ginguba é o nosso jantar.

Geração Alpha
Somos crianças desta nação
desnutridos de sonhos,
magros, alimentados por um futuro intrigante
onde a esperança a cada mês perece.

Parece que temos escolha, mas não
É tipo a democracia cá na banda,
uma mera ilusão...

Adolescente de 15 anos
prostitui-se para alimentar a família
O pai, indignado, deita fora a comida
A mãe faz prantos, e acusa a igreja de bruxaria
a irmã, carente e desnutrida, passa à fome
enquanto o irmão ajuda com o que pode
fazendo assaltos na ponte.

Quem somos nós? Quem sou eu!?
Para ser honesto,
e sem mencionar o resto,
não sei quem sou, por que eu luto
e nem tão pouco para onde vou.

Sinto nada, cansei-me de tudo
Sigo avante como manda o hino
buscando e abraçando o pouco
e do pouco que consigo
já é o suficiente pra garantir um copo
ou quem sabe um corpo
Até porque lixado já estou,
mas solitário é que não fico.


CXLVII

Rum & Cola

Cigarro na mão
Amor nos olhos
As horas passam
E já sinto as saudades
A correrem pelo corpo

Liberto o rancor em formas de fumo
No copo é aonde a minha mente segue,
sem direção sem rumo

Poderia fazer-me à estrada,
sem me importar com nada
Entrar numa casa de bordel,
deleitar-se no calor de corpos de aluguel

[...] Só que não [...]
Sorte ou destino,
preferi tomar uma dose de Sauvignon
para salvar a paz interior
que por acaso ela já terminou...

Chefia!
Abarrote o meu copo de paz, por favor
Quero achar o meu ego e
segredar-lhe os meus pensamentos...
Sangue-sangue não se fatigam
Rum para me lembrar que sou valente
E Coca-Cola para me dizer que sou de sangue puro

CXLI

On-line

De manhã, o relógio marca 7hr
A luz matinal vai entrando,
escapando pelo buraco da janela
coberto por cortinas semiabertas

Cama desarrumada, lençois amarrotados
Somos cumprimentados pela luz fraca
que aterra sobre os nossos corpos
maculados, despidos como anjos

Que corpo é este, tão terno e afável, que jaz sobre o meu?
Que alma febril é esta, que me faz companhia nesta cama tão gelada como o céu?

Receio de acordá-la, mas por outro lado anseio por conhecê-la
Anseio por saber como chegou nesta cama,
e como durante a noite
ousou despir a minha solitária alma

Enfim
A calma já não reside em mim,
Chá de camomila para me acalmar,
pois peito ainda sente a repercussão daquele beijo

O coração ainda sente as vertigens
causadas pela lubricidade daqueles lábios,
rosáceos, carnudos
softs como manteiga derretida no canudo

Os nossos lábios,
como navios em alto mar
sem bússola sem vento
embateram-se um ao outro

As línguas à deriva em todas as partes do corpo,
apreciando cada onda, cada mergulho
até cair nas profundidades
das nossas profanas concavidades
Onde instigamos os gostos, odores e orgulhos
até nos afundarmos no orgasmo mútuo

Ai...
Quem é?
Mas quem é?
Será que algum dia te vou voltar a ver?

Penso nestas questões todos os dias, todas as noites
Esperando pelo momento em que entras on-line e possas me dizer novamente o teu nome...